segunda-feira, 2 de março de 2015

Uma Operação de Busca e Salvamento



Para receber uma carga de Alvarinho em Viana, uns bons hectolitros dele,  e o transportar no meu graneleiro até Casablanca, desloquei-me com a minha tripulação à linda cidade minhota, aproveitando para degustar  um robalinho cozido na Mariana, um dos melhores restaurantes do Universo, quiçá mesmo um dos melhores restaurantes de Viana do Castelo.

Um dos fregueses habituais do Mariana era  Jorge Amado, escritor brasileiro com família por aqueles lados e que, por um acaso do destino, lá estava na sua mesa ao canto.
Conhecedor da fama de grande marinheiro que me precedia, Jorge fez questão de me conhecer e almoçar comigo.

Ficou contente de ouvir a minha história, fartou-se tomar notas das minhas aventuras, dos meus naufrágios, dos meus ataques de piratas e, sobretudo, do episódio em que amarrei o cargueiro onde navegava à época com todas as amarras disponíveis, numa arribada a um porto asiático. Nessa noite gozaram comigo como se não houvesse amanhã mas, quando um tufão nos atingiu  e só o meu cargueiro não soçobrou, viram todos quão grande marinheiro eu era, e sou.

O Jorge adorou a estória  e prometeu escrever a minha biografia.


Largamos de Viana de manhã cedinho com Mar de azeite, proa a Sul e uns dez nós de velocidade de cruzeiro, o que representava pouco mais de metade da capacidade do Neptuno, o meu graneleiro lindo, carregadinho de branco Alvarinho, delicioso.
Por volta de Vila do Conde ouvimos no rádio um pungente pedido de socorro, um May Day sofrido, que passo a reproduzir:
May Day May Day May Day, Mãe Puríssima Mãe Puríssima Mãe Puríssima, Posição ... (perdoem-me de  aqui não a divulgar) agua aberta, nove pessoas a bordo, duas com pernas partidas, uma com um panarício e outra com uma unha encravada, pedimos assistência urgente.
O Mãe Puríssima estava na nossa proa, pelo que iniciei de imediato as manobras para chegar rapidamente à embarcação em perigo.
Pego no rádio e transmito:
-Aqui NEPTUNO, graneleiro português na vossa rota, tenham calma, já vamos a caminho.
Mas ouvimos no rádio de seguida:
-Aqui Centro de Busca e Salvamento de Vila do Conde, já temos em vosso auxilio  duas corvetas, um helicóptero, um pneumático e o banheiro de Vila do Conde que insistiu em  participar e vai a nado..

Mas o Mãe Puríssima insistiu:
-May Day May Day, Temos apenas duas horas   antes de naufragar, um dos panarícios piorou, a unha encravada  caiu e eu estou cheio de sede (era o Mestre que falava)

Chamei o imediato, a situação era deveras grave, mandei pôr a máquina a toda a força.

E no rádio disse de seguida: 
-Pessoal, tenham calma, dentro de meia hora, talvez menos, estamos aí.

Espanto, no rádio ouviu se então:

-Aqui Centro de Busca e Salvamento de Vila do Conde, isto é um simulacro, sigam o vosso caminho.


Filhos da puta bradei, então isto é assim? Não avisam, não dizem nada a ninguém  e dão me cabo do coração com estas merdas?!!!

Pego no rádio e começo a insultá-los, evoquei  um Silence May Day, chamei-lhe aldrabões, chuis, funcionários de partido politico, azeiteiros e, pior, membros do governo.

Esta os tipos não gostaram e enviaram contra o meu graneleiro uma das corvetas e o banheiro de Vila do Conde que continuava a nado atrás da corveta.
Ordem de prisão que, na Marinha Portuguesa, é uma coisa séria e eis nos sob escolta obrigados a rumar a Leça, que o Neptuno não entrava em Vila do Conde.

Íamos todos ficar nos calabouços da Capitania, não fosse o Mestre da Mãe Puríssima ser o Tobias, que participava no simulacro e era amicíssimo  do Almirante que coordenava as operações.

Safou-nos  então o Mestre Tobias, mas a brincadeira custou-me boa parte da carga do Alvarinho que transportava e toda a reserva de papas de sarrabulho que adquirira em Ponte de Lima no restaurante Encanada e que guardava religiosamente para a merenda.






1 comentário:

Jackie Goulart disse...

Sem comentários. :D :D :D :D