terça-feira, 13 de setembro de 2016

O nosso Piloto Manibelas

Pois.
Leva-nos esta saga a um piloto novo naquela viagem, era a sua primeira de longo curso, recém-saído da Escola Náutica.
Tipo certinho, fazia bem os pontos, sempre disponível e trabalhador, pontual nos seus quartos, daqueles a quem podíamos confiar o navio entre dois gins bebidos na ponte ou na camarinha dos oficiais.
As viagens de longo curso são isso mesmo, longas. Lê-se muito, conversa-se mais e bebe-se também um bocado.
O jovem piloto ainda era parente do Mestre Tobias, penso que sobrinho por parte da mulher, e foi-me recomendado especialmente pelo mestre, a quem devia vários favores, como tenho vindo a relatar.
Não seria necessária grande recomendação, pois o jovem piloto era um Marinheiro de primeira água e potenciava vir a ter uma carreira brilhante nos cargueiros dos sete Mares.
Contava-lhe, nos longos serões na ponte, os nossos naufrágios, os ataques dos piratas, as aventuras nos bares da Indochina, os encontros com a marinha de Guerra, enfim quase tudo. Omitia-lhe, naturalmente, os episódios em que o seu tio, o mestre Tobias, contracenava connosco, por pudor na maior parte, mais que por educação.
Navegávamos naquela noite com rumo a Samatra, estávamos na ponte eu, o jovem piloto Jorge e o nosso imediato, o Comandante Pardal.
Entre dois gins, o nosso piloto, meio encavacado, dirigiu-se a mim e ao imediato, dizendo que tinha uma pergunta difícil para nos fazer.

--Diz lá Jorge, pergunta à vontade rapaz.
--Tenho bergonha meu comandante ( O Jorge, piloto de excelência, era Minhoto e tinha um sotaque, não negligenciável, galaico-duriense )
--Oh pá, atirava-lhe o Pardal, deixa-te de merdas, faz lá a pergunta.
--Tenho bergonha meu comandante, é mesmo difícil.
--Olha lá, se não querias fazer a pergunta, não falavas nisso, diz lá…
No meio do Oceano, o tempo e o gin fazem abertas as pessoas, mas o Jovem Jorge, de sotaque galaico duriense acentuado, ainda estava renitente, hesitava.
Mas decidiu-se:
--Os meus comandantes, com a idade que têm, ainda têm tesão?
Que raio de pergunta, eu que frequentava os principais prostíbulos de Istambul a Singapura, que tratava por tu os maiores empresários das casas de diversão nocturna?! Mas contive-me e deixei a resposta para o nosso imediato.
--Sabes como é Jorge, já não é como foi, mas ainda vai dando para as curvas, enfim, falo por mim e pelo nosso comandante, vai indo razoavelmente ….
O nosso jovem piloto, sobrinho do Mestre Tobias, deu-se por satisfeito, ou pareceu dar-se, e lá continuamos na ponte, não sem antes ter pedido ao cozinheiro para nos trazer  mais um gin para cada um de nós.
Passaram-se mais umas centenas de milhas sem grande história, com Mar de almirante, quartos alternados e pontos feitos pelo Imediato sr Pardal e pelo Piloto sr Jorge.
Estávamos já a menos de 150 milhas do porto de Kandang e o cozinheiro sr Bolha tinha preparado um magnifico bacalhau abanado, receita que eu lhe facultara, e que ele fazia com mestria.
O nosso piloto estava sentado à mesa, meio encabulado, adivinhava-se tempestade.
Diz então o Sr Jorge, jovem e talentoso piloto de acentuado sotaque galaico duriense.
--Oh meus comandantes, tenho   uma pergunta difícil para bos fazer, mas esta ainda é mais difícil, tenho bergonha…
Porra que este gajo já chateia com as perguntas difíceis. Não fora sobrinho do Mestre Tobias, a quem tantos favores devia, e ia pela borda fora.
--Oh rapaz, disse-lhe o imediato sr Pardal, desembucha .
--Tenho bergonha meu comandante…
--Oh caralho, voltamos ao mesmo, se não querias fazer a pergunta não falavas nisso, disse-lhe eu, já visivelmente irritado e quase entornando um copo de PapaFigos que acabara de encher.
--Jorginho, não te amofines com o comandante, dizia-lhe o nosso imediato, sr Pardal, faz lá a pergunta difícil que nós respondemos.
O nosso jovem piloto de acentuado sotaque galaico duriense, enche o peito e…
--Os meus comandantes, com a bossa idade, ainda dão à manibela?
Agora era demais, mas o sr Pardal, muito mais calmo que eu, usou da palavra, já que eu e o cozinheiro sr Bolha, estávamos caladinhos, os dois devíamos muitos favores ao tio do jovem piloto, o Mestre Tobias.
--Pois é rapaz, nunca percas o habito. Sabes, amanhã podes precisar e depois não te lembras como é, sentenciou o nosso imediato.

PS:
Do nosso piloto Jorge, Minhoto de acentuado sotaque galaico-duriense, recebemos a seguinte rectificação, que, com a devida vénia, passamos a transcrever:
"
Bom dia meu Comandante!
Da análise à história, solicito que seja retificada. Deve ficar bem referido que as minhas perguntas foram feitas no seguimento de um jogo que o meu Comandante propôs, que foi o jogo das perguntas difíceis. Como eu era o mais novo, tive de ser o primeiro a fazer a pergunta, que foi a seguinte "O meu Comandante ainda dá à manivela? ".
O meu Comandante respondeu " Nunca deixes de fazer o que podes vir a precisar." Quando fizeres a retifição, publica.
Abraço
"

domingo, 11 de setembro de 2016

O Movimento Termalista



O meu amigo Veiga mantêm um blog, o Ventosga, dedicado a temas náuticos .
O presente estudo não se enquadra na hidro temática, pelo que me solicitou a publicação no meu espaço, o que faço com muito gosto.

O movimento termalista

1-As origens
São remotas as origens do movimento termalista, remontando mesmo ao tempo dos faraós. São conhecidos vestígios de fontanários no antigo Egipto junto às pirâmides, onde os faraós se banhavam em leite de burra temperado com rum e sumo de ananás, numa bebida que ficaria, séculos mais tarde, conhecida por pinha colada.
Esta bebida, óptima no tratamento de joanetes de que os antigos egípcios sofriam muito, não  faria no entanto grande êxito, apesar das suas propriedades curativas, porque naqueles remotos tempos não tinham ainda imaginado juntar-lhe gelo, talvez porque a técnica dos frigoríficos ainda não estivesse muito desenvolvida.

Os romanos herdaram a tradição egípcia, fundando termas por tudo quanto era sitio conhecido naquela época, sobretudo no entanto em Roma, circundada de fontanários por todos os lados. Naquele tempo era fácil chegar às termas porque, apesar dos GPS ainda estarem nos seus primeiros tempos, os termalistas não se perdiam, bastava-lhes tomarem um caminho, qualquer que ela fosse, porque, como se sabe, todos os caminhos vão dar a Roma.
Os romanos sofriam muito de unhas encravadas, derivado das sapatilhas que usavam, as caligae, de técnica sapateira  muito deficiente. As termas mais usadas eram assim aquelas que se adequavam aquele mal dos pés. Foram assim criadas as famosas termas de pizzas e lasanhas, muito frequentadas pela sociedade romana da mais fina estirpe.

2 – Em Portugal
Os portugueses sempre foram grandes entusiastas do movimento termalista, até porque sempre sofreram das mais variadas maleitas, tais como espondilose, queda de cabelo, bicos de papagaio e penariços, tudo doenças facilmente tratadas em qualquer fontanário digno desse nome.
O nosso primeiro rei, Afonso Henriques, fundou e frequentou as termas de São Pedro do Sul, famosas na vitela de Lafões com tinto do Dão, trazendo para a simpática vila beirã toda a corte, cortezãs, éguas e cabras, fundamentais para a saúde sexual dos portugueses e portuguesas de então.
D.José e o seu primeiro ministro também frequentavam várias termas, das quais destacamos as famosas termas de Palmela com o queijo de Azeitão e o Moscatel roxo, fundamentais  para a cura da gota e do reumatismo.

3 -A Actualidade
Ficaram celebres  as visitas do grande António Silva às termas do Cartaxo, estas apropriadas aos tratamentos das enxaquecas e penariços.
Os portugueses agora frequentam mais as termas do Alto Douro que se tem especializado nos últimos tempos e criado fantásticos fontanários.
Eu próprio ainda há pouco fiz umas termas em Chaves onde constatei a excelência do seu presunto, das suas postas de carne e dos seus enchidos. O tratamento faz-se à vontade do doente, sendo apenas necessária a apresentação da prescrição médica, que pode, no entanto, em grande tradição termalista, ser conseguida na altura. O sr Padre Fontes de Vilar de Perdizes, por exemplo, nas termas de Chaves, pode facultar aos seus pacientes, a devida e necessária prescrição dos tratamentos a efectuar.
Também muito conhecidas e frequentadas as termas galegas de Baiona onde se podem encontrar múltiplos e variados fontanários, ricos em Ribeiro, Alvarinho,  polvo à galega e variado de marisco, especialmente indicados para as maleitas dos pés, sobretudo os joanetes.
Mais perto de Aveiro, óptimas para as doenças do forno intimo tais como parasitas nas partes baixas, borbulhas na cara e frigidez feminina, temos as termas da Mealhada, com o seu  tinto bruto e leitão assado.
Infelizmente aqui é obrigatório beber meio copinho de agua ao fim da tarde, bebido no entanto às escondidas e de olhos fechados para custar menos.
Espero desta forma ter contribuído para um maior esclarecimento do que é o movimento termalista e dessa forma tornar as vidas dos meus amigos mais fáceis e mais agradáveis.