domingo, 19 de junho de 2011

A minha passagem pela Marinha de Guerra

Não pensem os meus Amigos que a formação contínua e  o continuo aperfeiçoamento não fazem parte das minhas preocupações.
Desse modo aqui há uns  anos frequentei  um curso de reciclagem de navegação, na Escola  de Vila Franca, um pouco a montante do Mar da Palha que, como é genericamente sabido, é tenebroso.
Como Capitão de Longo Curso almoçava com regularidade na messe dos oficiais, convidado pelo monitor do curso que frequentava, nos intervalos das aulas.
À mesa os meus colegas e o professor bebiam sistemáticamente água, muitas vezes com boas pomadas a acompanhar os petiscos que nos serviam.
Oriundo da Marinha Mercante imaginei que seria um hábito da Marinha das Fragatas e dos Couraçados e, por isso, nada retorqui e, igorando o (mau) hábito dos meus comensais, continuei a pedir o meu habitual tinto.
Na primeira quinta feira, dia da Marinha, fui convidado para almoçar com o Almirante comandante da Escola.
Como convidado e Lobo do Mar, sentaram-me à frente do Almirante, tendo ao meu lado direito o Imediato e à esquerda o Oficial mais graduado.
Naturalmente seria sempre o primeiro a ser servido, o imediato o penultimo e o Almirante comandante da escola o último.
Na  Marinha é assim.
Assim, logo na primeira abordagem, aproxima-se de mim o grumete de serviço e pergunta-me:
--Senhor Comandante, o que deseja beber ??
Pergunta dificil, o tinto era de estalo, mas tradição é tradição, o ambiente era formal, não queria de forma alguma destoar na tradição.
Cheio de peito atirei:
--Água por favor...
--Oh senhor Capitão, água!!?? o senhor vai beber água com as favas com presunto que temos para o almoço ?
Dupla ironia, primeiro o peito com que pedi água era imenso, não permitia recuo, por outro, o Almirante tratou-me por Capitão e sempre me disseram  que na Armada Capitão era o limpa retretes.
Mas aguentei a pancada, pedi água, beberia água.
E aqueles 'camelos' beberam um Dão de 81 de estalo, que me deixaria deprimido durante meses, cotejado com a água do Luso que eu bebia, não fora o mestre Tobias, o da traineira, que estava alí a fazer um curso de reciclagem de pesca de borbas marrecos e que por acaso passava pelo Almirantado e, vendo-me em transe profundo me deu, à sorrelfa e em inteira clandestinidade, um cantil cheinho de Douro do Pinhão, que ele tinha guardado para uma doença e que, por troca de favores manhosos, de que constava o fornecimento de quantidades imensas de tinto do meu cargueiro, alí mesmo me passou.

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